Eu não sei se você já percebeu, mas hoje em dia a gente consegue observar um fenômeno interessante: há muita criança com uma agenda mais atribulada que a de grandes executivos.
A criança faz judô, ballet, inglês, música, pintura, chinês, enfim... Tudo o que os pais acham que pode ser importante para o futuro dos pequenos: o máximo de atividades possíveis, de maneira a deixar a agenda da criança bastante ocupada. Essa situação ocorre basicamente por dois motivos: desejo dos pais em acelerar o desenvolvimento dos filhos e torna-los mais “competitivos” (no que se refere aos atributos exigidos pelo mercado de trabalho) e a necessidade de preencher o espaço de tempo das crianças enquanto os pais estão no trabalho.
“Mas Juliana, isso é bom! Afinal de contas, eu possibilito que a criança seja muito capacitada e se desenvolva mais rápido e, além de tudo eu consigo deixa-la com alguém, fazendo algo produtivo, nas situações em que eu não posso ficar com ela ou em que não disponho de alguém para acompanha-la”. Eu não nego aqui que há, sim, uma necessidade dos pais em ter que deixar seus filhotes com alguém enquanto trabalham, do contrário, o trabalhar seria inviabilizado. O que eu questiono muito reside sempre em uma palavrinha que deveria ser chave na nossa vida: equilíbrio. O grande problema mora nos excessos. Ah! E, nesse caso, também no desrespeito às vontades e interesses da criança.
Que tipo de disfunções essa sobrecarga causa nos pequenos?
Primeiramente, o excesso de atividades pode causar uma série de disfunções no organismo da criança, especialmente em função de um inimigo que – antigamente – era comum nos adultos: estresse. Você não se sente estressado quando tem uma semana cheia, com vários compromissos e responsabilidades? Apesar de serem crianças, elas sofrem exatamente a mesma coisa. Aliás, no caso delas é pior, pois estamos falando de um organismo em desenvolvimento, logo, as sequelas do estresse são talvez ainda mais significativas. E o estresse, assim como várias outras disfunções psicológicas, podem somatizar e refletir em problemas físicos de saúde, como, gastrite, dores de cabeça, hiperatividade, ansiedade, medo e agressividade. Além disso, as crianças têm mais dificuldade em se tornarem independentes (afinal, têm que fazer – e muito bem - uma atividade que foi escolhida por outra pessoa, que imputa nela um mundo de expectativas).
Além disso, na maioria das situações, é comum que os adultos enxerguem na criança um ser desprovido / incapacitado de entender as próprias vontades e o que é melhor para ele. Como vivemos em uma cultura de poder, especialmente de imposição do mais forte sob o mais fraco, é mais fácil o adulto tomar a posição de “eu sou seu pai/mãe/tia/tio/avô/avó/mais-velho-que-você e sei o que é melhor” do que procurar saber da criança se ela se sente satisfeita em realizar alguma atividade ou não, em entender suas motivações e interesses. Resultado: várias crianças fazem alguma atividade porque algum adulto ou pediu, ou mandou, ou julgou que deveria ser feita. Então, algo que deveria ser positivo, se torna extremamente estressante para os pequenos. E, ao invés de aprender algo nas atividades que realiza, a criança aprende mesmo é a se adaptar a um ritmo insano de afazeres.
E é aí que entra o próximo argumento: não é só estressante do ponto de vista de quantidade de atividades, mas também do ponto de vista de pressão psicológica, especialmente no sentido da competitividade. Muitas das atividades que a criança desenvolve foram determinadas pelos pais ou porque “toda criança faz” (logo, seu filho não pode “ficar para trás" e tem que fazer também) ou porque o filho tem que se tornar um gêniozinho para ser uma pessoa bem sucedida no futuro. E o interesse, a aptidão, o dom, a vocação da criança? Em que momento entram nessa história? Quer um exemplo de como isso é comum? O jornalista britânico Carl Honoré conta sua saga de quando começou a pensar sobre essa questão, o que o levou a estudar o superagendamento infantil, a cunhar o termo slow parenting e a se tornar uma das pessoas que mais discute o assunto. Veja se você já não viu o que aconteceu com ele, ocorrer de forma muito semelhante por aí.
Tudo começou quando a professora do filho de Carl disse que o garoto era ‘um jovem artista talentoso’. Na hora, a visão de criar o novo Pablo Picasso passou pela cabeça do pai. No mesmo dia, Carl começou a procurar cursos de arte para o filho, que na época tinha sete anos, até que o menino disse “pai, não quero ter um professor, só quero desenhar. Por que os adultos sempre querem cuidar de tudo?”. E foi assim que Carl levou um "tapa de luva / choque de realidade" do filho e começou a ver a coisa sob outra perspectiva. Ele diz que, depois que começou a estudar a questão, enxergou que o gatilho é sempre a boa intenção dos pais, no entanto, a vontade em ser um pai “perfeito” faz com que a educação seja um jogo de tudo ou nada.
A criança faz judô, ballet, inglês, música, pintura, chinês, enfim... Tudo o que os pais acham que pode ser importante para o futuro dos pequenos: o máximo de atividades possíveis, de maneira a deixar a agenda da criança bastante ocupada. Essa situação ocorre basicamente por dois motivos: desejo dos pais em acelerar o desenvolvimento dos filhos e torna-los mais “competitivos” (no que se refere aos atributos exigidos pelo mercado de trabalho) e a necessidade de preencher o espaço de tempo das crianças enquanto os pais estão no trabalho.
“Mas Juliana, isso é bom! Afinal de contas, eu possibilito que a criança seja muito capacitada e se desenvolva mais rápido e, além de tudo eu consigo deixa-la com alguém, fazendo algo produtivo, nas situações em que eu não posso ficar com ela ou em que não disponho de alguém para acompanha-la”. Eu não nego aqui que há, sim, uma necessidade dos pais em ter que deixar seus filhotes com alguém enquanto trabalham, do contrário, o trabalhar seria inviabilizado. O que eu questiono muito reside sempre em uma palavrinha que deveria ser chave na nossa vida: equilíbrio. O grande problema mora nos excessos. Ah! E, nesse caso, também no desrespeito às vontades e interesses da criança.
Que tipo de disfunções essa sobrecarga causa nos pequenos?
Primeiramente, o excesso de atividades pode causar uma série de disfunções no organismo da criança, especialmente em função de um inimigo que – antigamente – era comum nos adultos: estresse. Você não se sente estressado quando tem uma semana cheia, com vários compromissos e responsabilidades? Apesar de serem crianças, elas sofrem exatamente a mesma coisa. Aliás, no caso delas é pior, pois estamos falando de um organismo em desenvolvimento, logo, as sequelas do estresse são talvez ainda mais significativas. E o estresse, assim como várias outras disfunções psicológicas, podem somatizar e refletir em problemas físicos de saúde, como, gastrite, dores de cabeça, hiperatividade, ansiedade, medo e agressividade. Além disso, as crianças têm mais dificuldade em se tornarem independentes (afinal, têm que fazer – e muito bem - uma atividade que foi escolhida por outra pessoa, que imputa nela um mundo de expectativas).
Além disso, na maioria das situações, é comum que os adultos enxerguem na criança um ser desprovido / incapacitado de entender as próprias vontades e o que é melhor para ele. Como vivemos em uma cultura de poder, especialmente de imposição do mais forte sob o mais fraco, é mais fácil o adulto tomar a posição de “eu sou seu pai/mãe/tia/tio/avô/avó/mais-velho-que-você e sei o que é melhor” do que procurar saber da criança se ela se sente satisfeita em realizar alguma atividade ou não, em entender suas motivações e interesses. Resultado: várias crianças fazem alguma atividade porque algum adulto ou pediu, ou mandou, ou julgou que deveria ser feita. Então, algo que deveria ser positivo, se torna extremamente estressante para os pequenos. E, ao invés de aprender algo nas atividades que realiza, a criança aprende mesmo é a se adaptar a um ritmo insano de afazeres.
E é aí que entra o próximo argumento: não é só estressante do ponto de vista de quantidade de atividades, mas também do ponto de vista de pressão psicológica, especialmente no sentido da competitividade. Muitas das atividades que a criança desenvolve foram determinadas pelos pais ou porque “toda criança faz” (logo, seu filho não pode “ficar para trás" e tem que fazer também) ou porque o filho tem que se tornar um gêniozinho para ser uma pessoa bem sucedida no futuro. E o interesse, a aptidão, o dom, a vocação da criança? Em que momento entram nessa história? Quer um exemplo de como isso é comum? O jornalista britânico Carl Honoré conta sua saga de quando começou a pensar sobre essa questão, o que o levou a estudar o superagendamento infantil, a cunhar o termo slow parenting e a se tornar uma das pessoas que mais discute o assunto. Veja se você já não viu o que aconteceu com ele, ocorrer de forma muito semelhante por aí.
Tudo começou quando a professora do filho de Carl disse que o garoto era ‘um jovem artista talentoso’. Na hora, a visão de criar o novo Pablo Picasso passou pela cabeça do pai. No mesmo dia, Carl começou a procurar cursos de arte para o filho, que na época tinha sete anos, até que o menino disse “pai, não quero ter um professor, só quero desenhar. Por que os adultos sempre querem cuidar de tudo?”. E foi assim que Carl levou um "tapa de luva / choque de realidade" do filho e começou a ver a coisa sob outra perspectiva. Ele diz que, depois que começou a estudar a questão, enxergou que o gatilho é sempre a boa intenção dos pais, no entanto, a vontade em ser um pai “perfeito” faz com que a educação seja um jogo de tudo ou nada.
E este "colocar expectativas na criança" traz à tona outra questão, que é a necessidade de carinho e aprovação que a criança sente. Como os pais esperam sempre os melhores resultados em relação às atividades que desempenham, as crianças procuram realizar suas tarefas da melhor forma possível, pois o reconhecimento que recebem é sinônimo de carinho. Esse reconhecimento é onde muitas crianças – especialmente aquelas mais carentes, que não recebem carinho ou atenção em casa – encontram um momento em que os pais a enxergam com um olhar diferente e sentem que têm a atenção de seus pais. Por outro lado, existem aquelas que tentam chamar a atenção por meio da rebeldia, ao tentar driblar suas “obrigações e responsabilidades” e mostrar para os pais que querem ser ouvidas e querem atenção. O problema é que, como não entendem bem o que sentem e ainda estão em processo de desenvolvimento, comunicar essa necessidade é algo muito difícil. Então é no choro e/ou na subversão que a criança encontra uma maneira de chamar a atenção pelo menos um pouco para si.
Outro ponto importante a observar é a necessidade do ócio. Assim como os adultos precisam de um tempo livre, sem responsabilidades a cumprir, a criança precisa ter tempo para brincar e se divertir. Afinal, o brincar é a principal ferramenta de desenvolvimento de uma criança (tão importante, que terá um post só para ele no futuro).
E como fazer diferente?
Primeiramente, estimular a criança por meios diferentes, mas principalmente respeitar seus interesses e vontades, incentivando que eles participem do planejamento dos compromissos de uma vida que é deles. O aprendizado é rápido e fácil quando acontece através de atividades prazerosas para a criança. É isso que, inclusive, as ajuda a trabalhar seus pensamentos e inteligências para áreas com as quais não tenham afinidade.
Outro ponto, dar atenção e carinho para os pequenos. As vezes a rotina cansativa, o mundo de atribulações e responsabilidades dos pais os fazem priorizar outras atividades em detrimento dos filhos. E quando digo atenção, não é viver em função da criança, mas pelo menos olhar para ela, quando ela quiser falar ou conversar. É se interessar e perguntar como a criança se sente em relação a algo, afinal ela também tem interesses e sentimentos que precisam ser respeitados. É sugerir programas juntos no fim de semana e fazer ela um agente participante da rotina da família, ao trazê-la para as decisões do que será feito em conjunto. Por exemplo, os pais podem sugerir programas diferentes (ir ao circo, ao parque, ao cinema, etc) e escolher com a criança de forma colaborativa. Isso a ajuda a se tornar responsável por suas escolhas, além de fazer com que o processo seja colaborativo. A questão está tão em voga que há iniciativas que trabalham nesse sentido, como o Movimento Slow Kids - desenvolvido pelo Instituto Alana –que tem o objetivo de tratar de questões relacionadas à criança com base na desaceleração, maior contato com a Natureza e pensamento sustentável, por meio de ações como cinema ao ar livre, picnic, música e brincadeiras, e que contam com a participação ativa dos pais.
Enfim, sem dúvidas, é muito importante que a criança desenvolva outras atividades, até porque na escola (principalmente a tradicional) não há muito espaço para isso, como já mostramos em alguns dos posts do Sinteno. Essas atividades trazem inúmeros benefícios para o aprendizado das crianças e isso é inegável. A grande questão talvez esteja no equilíbrio e na finalidade das coisas. É importante demais olhar para a criança como ser humano, que tem uma história, interesses próprios, particularidades que precisam ser respeitadas, e não um robozinho que deve buscar ser o melhor dentro de um mundo competitivo. Tão crítico quanto isso é quando se tenta fazer da criança um reflexo dos interesses dos pais: se o pai não teve a oportunidade de fazer algo que gostaria na sua infância, não deveria jogar essa responsabilidade (que é grande demais) nas costas do seu filho. Deveria busca-la ele mesmo. O importante é ajudar a criança a encontrar satisfação e realização no que faz, a se descobrir enquanto ser humano, não vincular resultados a carinho e atenção (até porque essa fórmula é muito perigosa) e mostrar que a felicidade está no meio e não no fim.
Outro ponto importante a observar é a necessidade do ócio. Assim como os adultos precisam de um tempo livre, sem responsabilidades a cumprir, a criança precisa ter tempo para brincar e se divertir. Afinal, o brincar é a principal ferramenta de desenvolvimento de uma criança (tão importante, que terá um post só para ele no futuro).
E como fazer diferente?
Primeiramente, estimular a criança por meios diferentes, mas principalmente respeitar seus interesses e vontades, incentivando que eles participem do planejamento dos compromissos de uma vida que é deles. O aprendizado é rápido e fácil quando acontece através de atividades prazerosas para a criança. É isso que, inclusive, as ajuda a trabalhar seus pensamentos e inteligências para áreas com as quais não tenham afinidade.
Outro ponto, dar atenção e carinho para os pequenos. As vezes a rotina cansativa, o mundo de atribulações e responsabilidades dos pais os fazem priorizar outras atividades em detrimento dos filhos. E quando digo atenção, não é viver em função da criança, mas pelo menos olhar para ela, quando ela quiser falar ou conversar. É se interessar e perguntar como a criança se sente em relação a algo, afinal ela também tem interesses e sentimentos que precisam ser respeitados. É sugerir programas juntos no fim de semana e fazer ela um agente participante da rotina da família, ao trazê-la para as decisões do que será feito em conjunto. Por exemplo, os pais podem sugerir programas diferentes (ir ao circo, ao parque, ao cinema, etc) e escolher com a criança de forma colaborativa. Isso a ajuda a se tornar responsável por suas escolhas, além de fazer com que o processo seja colaborativo. A questão está tão em voga que há iniciativas que trabalham nesse sentido, como o Movimento Slow Kids - desenvolvido pelo Instituto Alana –que tem o objetivo de tratar de questões relacionadas à criança com base na desaceleração, maior contato com a Natureza e pensamento sustentável, por meio de ações como cinema ao ar livre, picnic, música e brincadeiras, e que contam com a participação ativa dos pais.
Enfim, sem dúvidas, é muito importante que a criança desenvolva outras atividades, até porque na escola (principalmente a tradicional) não há muito espaço para isso, como já mostramos em alguns dos posts do Sinteno. Essas atividades trazem inúmeros benefícios para o aprendizado das crianças e isso é inegável. A grande questão talvez esteja no equilíbrio e na finalidade das coisas. É importante demais olhar para a criança como ser humano, que tem uma história, interesses próprios, particularidades que precisam ser respeitadas, e não um robozinho que deve buscar ser o melhor dentro de um mundo competitivo. Tão crítico quanto isso é quando se tenta fazer da criança um reflexo dos interesses dos pais: se o pai não teve a oportunidade de fazer algo que gostaria na sua infância, não deveria jogar essa responsabilidade (que é grande demais) nas costas do seu filho. Deveria busca-la ele mesmo. O importante é ajudar a criança a encontrar satisfação e realização no que faz, a se descobrir enquanto ser humano, não vincular resultados a carinho e atenção (até porque essa fórmula é muito perigosa) e mostrar que a felicidade está no meio e não no fim.